Justiça Federal derruba cobrança de impostos sobre benefício fiscal de ICMS

Uma das sentenças impede a tributação pelo PIS, Cofins, Imposto de Renda e CSLL

Três recentes decisões judiciais afastaram a tributação de crédito presumido de
ICMS – tipo de benefício fiscal dado a empresas. Duas delas são sentenças
proferidas pela Justiça Federal de São Paulo e a outra é uma liminar dada pelo
desembargador Rubens Calixto, da 3a Turma do Tribunal Regional Federal da 3a
Região (TRF-3). As ações questionam a aplicação da Lei das Subvenções (no
14.789/2023), uma das apostas do Ministério da Fazenda para cumprir as metas
fiscais deste ano.

São as primeiras sentenças da 3a Região, que engloba São Paulo e Mato Grosso do
Sul, que se tem notícia. Uma delas, favorável a uma indústria têxtil, afastou a
cobrança de PIS, Cofins, Imposto de Renda (IRPJ) e CSLL, assim como os efeitos da
nova norma, editada no fim do ano passado. A outra foi parcialmente favorável a
uma empresa de laticínios, vedando a incidência até a entrada em vigor da nova
legislação.

A partir da lei atual, fruto da conversão da Medida Provisória 1.185/2023, a União
passou a poder cobrar imposto sobre os benefícios fiscais de ICMS. Porém, para
tributaristas, a legislação é inconstitucional e desrespeita a jurisprudência sólida do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Na visão deles, há uma ofensa ao pacto federativo
e à própria natureza do crédito presumido, que é diferente dos outros tipos de
benefícios – como isenção, diferimento, redução de base de cálculo ou alíquota.

O crédito presumido, afirmam o especialistas, seria o que a doutrina chama de
“grandeza positiva”, enquanto os demais são “grandezas negativas”. Isso quer dizer
que eles têm efeitos contábeis diferentes – em um o crédito é dado à empresa e
representa uma renúncia fiscal para o Estado e, nos outros, há uma desoneração,
que reduz despesa para o contribuinte. Esse foi um dos principais fundamentos na
tese estabelecida pela 1a Seção do STJ, em abril do ano passado, em recurso
repetitivo (Tema 1182).

Nesse acórdão, o ministro relator Benedito Gonçalves reforçou julgamento anterior,
em que se exclui a tributação de IRPJ e CSLL para crédito presumido. Ficou definido
que “a concessão do crédito presumido de ICMS representa renúncia a parcela de
arrecadação, de modo que a tributação pela União desses valores significaria ‘a
irradiação de efeitos indesejados do seu exercício sobre a autonomia da atividade tributante de pessoa política diversa, em desarmonia com valores éticos-
constitucionais inerentes à organicidade do princípio federativo” (EResp 1517492).

Esses dois precedentes foram citados pelo juiz Alexey Suusmann Pere, da 2a Vara
Federal de Guarulhos (SP), que concedeu sentença a uma indústria têxtil. Na visão
dele, essa é uma jurisprudência “consolidada” de que o crédito presumido é um
“incentivo fiscal voltado à redução de custos”, portanto, não assume “natureza
jurídica de receita ou faturamento para efeito de composição da base de cálculo do
IRPJ e da CSLL”.

Ele lembrou ainda de uma ação pendente de julgamento no Supremo Tribunal
Federal (STF), em que houve a formação de maioria, no Plenário Virtual, pela
exclusão dos créditos presumidos de ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins (RE
835818). O placar, porém, foi zerado após pedido de destaque – o que transferiu o
caso para o plenário físico.

Para o juiz, a nova lei editada ano passado “não tem o condão de alterar a própria
natureza jurídica do instituto”. Por isso, permitiu que o contribuinte excluísse os quatro impostos federais da base de cálculo do benefício fiscal (processo no
5002069-31.2024.4.03.6119).

Francisco Leocádio, sócio do Souza Okawa Advogados, escritório que defende o
contribuinte, diz que o entendimento confirma a jurisprudência desde 2017 nos
tribunais – que não poderia ser alterada pela nova lei. “Ela confirma que o crédito
presumido, por sua natureza, não deve integrar a base de cálculo. É um benefício
concedido pelo Estado, sem recuperação nas etapas seguintes”, afirma.

Segundo ele, as decisões sobre crédito presumido têm sido mais favoráveis aos
contribuintes do que outros benefícios fiscais por conta dos precedentes do STJ. Os
entendimentos favoráveis às companhias, acrescenta, mostram que “o Judiciário
tem prestado atenção para a segurança jurídica e o pacto federativo”.

Já a outra sentença foi dada pela 6a Vara Cível Federal de São Paulo para uma
empresa de laticínios. Porém, sem a mesma abrangência. A juíza Denise Aparecida
Avelar concordou que o crédito presumido não pode ser tributado, mas entende
que a nova lei não viola o pacto federativo por ser “expressa ao dispor que o valor do
crédito fiscal não será computado na base de cálculo do IRPJ, CSLL, PIS e Cofins”.

A legislação estabelece requisitos para ser disponibilizado o crédito, assim como
mecanismos de habilitação na Receita Federal. Por isso, na visão da juíza, “após a
vigência da Lei no 14.789/2023, exige-se o preenchimento dos requisitos por esta
previstos, para que o crédito presumido de ICMS não seja computado na base de
cálculo do IRPJ e CSLL”. O caso envolvia apenas o afastamento da tributação de IRPJ e
CSLL (processo no 5034616-21.2023.4.03.6100).

Guilherme Saraiva Grava, do Diamantino Advogados Associados, que representou a
empresa, diz que vai recorrer para afastar a tributação também a partir da nova
legislação. Mas já vê a sentença como positiva por ter confirmado o precedente do
STJ. “O argumento do STJ foi constitucional. Ele diz que a tributação é invasão da
União na receita do Estado. O fato é que a lei nova não muda esse argumento.”

Em um agravo de instrumento, julgado pelo desembargador Rubens Calixto, uma
empresa de produtos de limpeza e higiene conseguiu uma tutela para não pagar PIS
e Cofins sobre o benefício de ICMS. Para Calixto os créditos presumidos “constituem

verdadeiras renúncias fiscais dos Estados, o que impede a União de tributá-los”
(processo no 5015730-04.2024.4.03.0000).

Marcio Abbondanza Morad, do RVC Advogados, que atuou no caso, também elogia a
preservação de julgados do STJ, “afastando expressamente a Lei no 14.789/23, que
não teria o condão de alterar a natureza jurídica de renúncia fiscal do benefício”. O
valor da causa é de R$ 18 milhões.

Em outra sentença, a primeira que se teve notícia, a 6a Vara Federal do Rio de Janeiro,
da 2a Região, afastou a cobrança de IRPJ e CSLL sobre crédito presumido de ICMS.
Não é tão abrangente como a de São Paulo, que alcança quatro tributos.

Procurada, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) não quis comentar o
assunto.

Fonte: Valor Econômico

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