O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a correção do Fundo de Garantia por
Tempo de Serviço (FGTS) não pode ser inferior à inflação. A decisão, por maioria de
votos, altera a forma de cálculo feita hoje e segue um acordo firmado entre União e
centrais sindicais. Os efeitos do novo entendimento devem começar a valer a partir
da publicação da ata de julgamento.
Essa estimativa já havia sido alterada pela própria AGU. Ela considerava o pior
cenário de correção, com base no pedido feito pelo partido Solidariedade — que
propôs a ação julgada pelo STF — de afastamento da TR e determinação de um
índice de inflação para corrigir os depósitos. Seria o cenário mais custoso para a
União, em especial pela possibilidade de efeito retroativo.
Hoje, o FGTS rende 3% ao ano mais TR (Taxa Referencial) e a distribuição de lucros
pelo Conselho Curador, que é uma liberalidade do fundo. A partir do voto do relator,
ministro Luís Roberto Barroso, a AGU já havia estimado outro impacto. Ele votou
para que o FGTS tivesse ao menos a remuneração da poupança (que está em 6,17%)
ao ano.
Em recente memorial da Advocacia-Geral da União (AGU) o impacto estimado era de
R$ 19,9 bilhões em seis anos, se a remuneração fosse pela poupança.
Nessa semana, o governo apresentou a proposta que acabou prevalecendo na
votação de hoje no Supremo. A proposta foi acordada com centrais sindicais, em
uma negociação feita a partir da tramitação do processo. Acordaram garantir ao
menos a inflação pelo IPCA (que, em 12 meses, está em 3,93%) na correção pela TR e
3% mais remuneração pelo lucro.
Os ministros se dividiram em três propostas. Com Barroso, pela aplicação da
poupança votaram André Mendonça, Nunes Marques e Edson Fachin.
O ministro Cristiano Zanin votou para manter a remuneração atual e foi
acompanhado pelos ministros Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Gilmar Mendes.
O ministro Flávio Dino votou pela correção pela TR mais 3%, com remuneração que
garanta IPCA em todos os exercícios, conforme acordo realizado entre União e
centrais sindicais. O voto dele foi seguido pelos ministros Cármen Lúcia e Luiz Fux.
Pelo “voto médio”, o entendimento de Dino foi a corrente que prevaleceu. Assim, os
efeitos da decisão já serão sentidos na distribuição que será feita até 31 de agosto
para as contas com saldo até 31 de dezembro de 2023.
O julgamento foi marcado por debates entre os ministros sobre a função social do
FGTS, ligado ao financiamento de moradia e a necessidade de proteger ganhos dos
trabalhadores. A corrente de ministros que se filiava à maior correção do FGTS dizia
defender o direito do trabalhador. “Dai ao trabalhador o que é do trabalhador”,
afirmou o ministro André Mendonça, em um momento em que citaram brevemente
questões bíblicas sobre impostos. “Nesse ponto acho que estou mais social do que
liberal”, completou o ministro.
Já a outra corrente defendia o papel social do FGTS, de financiar moradias dos mais
pobres, defendida especialmente por Dino e Zanin. “A minha posição é igualmente
social. Apenas estou cuidando dos mais pobres, dos mais pobres que trabalham na
construção civil”, afirmou Dino. Por uma questão social, ele disse defender o modelo
acordado entre AGU e as centrais sindicais.
Segundo Zanin, a procedência da ação teria impacto significativamente desfavorável
para a população de baixa renda no Brasil e um acréscimo financeiro pouco
relevante para cotistas do fundo no mesmo estado social. Haveria um acréscimo de
remuneração anual médio de R$ 188,65 em cada conta de trabalhador que recebe
de três a quatro salários mínimos, que correspondem a 15% das contas e 83% do
dinheiro do FGTS. Já 1% das contas que tem saldo médio de R$ 163 teriam aumento
anual médio de R$ 2,027,00.
Após a vitória da União, o Advogado-Geral da União (AGU), Jorge Messias, afirmou
que a decisão permite a continuidade dos financiamentos da casa própria. “Ganham
os trabalhadores, os que financiam suas moradias e os colaboradores do setor de
construção civil”.
O AGU destacou que decisão demonstra que governo do presidente Luiz Inácio Lula
da Silva faz “diálogo construtivo”. Nos anos em que a remuneração não alcançar o
IPCA, caberá ao Conselho Curador do Fundo determinar a forma de compensação.
Para Luis Gustavo Nicoli, advogado trabalhista e sócio do Nicoli Sociedade
Advogados, “este acordo visa garantir o mínimo necessário para não sobrecarregar o
erário público com o pagamento de indenizações bilionárias e, ao mesmo tempo,
assegurar que os rendimentos dos trabalhadores não fiquem abaixo da correção
monetária”, diz.
Nicoli pondera que o lado negativo da decisão é que a regra só vai atingir os
depósitos futuros. “Portanto, as centenas de milhares de ações discutindo essa
atualização e correção monetária não serão impactadas. Elas serão julgadas
improcedentes”, afirma.
Fonte: Valor Econômico